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11 de novembro de 2016

Eu, morador de Copacabana, 34 anos, adolescente e falido.

Nunca me senti tão feliz em ter 34 anos. Eu trabalhei muito duro na vida pra conquistar meus sonhos. Quantas conquistas!! Sempre sonhei em dormir em uma suite, com cama de casal e ar condicionado sem precisar sair do quarto pra ir ao banheiro. Hoje finalmente depois de ser expulso de 3 colégios, me formar na faculdade, terminar uma pós, aprendendo a analisar o mercado durante anos, trabalhar de garçom, ter sido burro de carga em hotel, encaixotar comida chinesa e sair do mercado de trabalho como analista financeiro de negócios, finalmente comprei um tablet e paguei todas as minhas dívidas - acredite, eu tinha muitas.
   Sim..., e aqui está ele, o meu maior patrimônio conseguido com ajuda de todos os direitos trabalhistas que a esquerda conseguiu me garantir nesse mundo sangue-suga capitalista: meu quarto com ar condicionado e banheiro (parece um pinico, mas é banheiro).
Meu quarto fica aqui é em Copacabana na casa da minha mãe que vive de pensão e me amamentava na hora do almoço. Aqui e eu sou totalmente livre pra usar da forma que eu quiser, posso até pendurar quadro e dormir até tarde - menos às sextas, quando a diarista vem e eu não posso dormir até meio dia porque, né? Minha mãe fica chateada se ela não limpa meu quarto.
   Infelizmente isso não é engraçado. Por isso que hoje em dia convivemos com muito adulto pseudo intelectual de barba lamber achando que o mercado de trabalho e a economia estão impossíveis, enquanto estuda pra concurso, pedindo o mestrado de presente pros pais pra poder ganhar mais em alguns anos mamando na teta do governo odiado.
   A geração Y ganhou um mundo de possibilidades nas mãos - mas ninguém ensinou a usar. Eu entendo que é difícil empreender através da real meritocracia e ainda educar um ser humano totalmente diferente sem ninguém ter te dado uma pista além do chinelo. O nossos pais fizeram o melhor que puderam, mas adivinha: nossos pais estão de saco cheio e com medo por nos ver em casa. Alguns até nos querem perto e nos querem bem, mas inegavelmente estão com vergonha de falar pros amigos deles que ganhamos 2 mil reais pra poder pagar parcela do carro, tomar chop na Nelson Mandela em Botafogo e pagar um picolé Magnum na piscina condomínio do amigo emergente que mora em Curicica e fala que é Barra. Por que, né? Nascemos em uma família que tinha Chevette 80 e depois Monza, Santana Quantum e Astra 99,  frequentamos Anglo Americano, Notre Dame, Colégio São Paulo e todos aquelas escolas com nome de santo em Botafogo, quando na nossa infância. Nós hoje viajamos de Groupon com milhas pra Buenos Aires e não queremos pegar trem (sick), mas tiramos selfie na cobertura da amiga no LeBron e vamos pra casa de ônibus troncal. Nosso Instagram é de dar inveja, tem muita "força foco e fé" enfeitando o mundo dos sonhos dos finais de semana em Búzios de qualquer adulto vazio.
   Leitor, fale aos seus amigos da Zona Sul carioca que somos em maioria acomodados na casa de nossas famílias porque ninguém quer sair de perto da praia esperando o almoço sair assistindo Canal Off,  pra viver com os próprios recursos em Água Santa ou na Baixada e ter que conhecer o mundo real. A causa dessa geração ter dado errado: não fizemos esforço porque sempre vivemos como filhos de alguém que fazia algo importante pra outro alguém que de fato era importante. Hoje as multinacionais só funcionam porque essa galera que pega trem e mora longe dessa nojeira, ta lá querendo subir pra comer  batata Pringles no saguão do aeroporto. Enquanto isso, os filhos da classe média dos anos 90 que não são atropelados por gente que aprendeu na marra a se virar, tão gerenciando qualquer processo, se perguntando o quê deu de errado e, se alguém pode dar uma força com o bebê porque a babá também tem vida e foi embora. Se perguntando por que é tão difícil crescer no Brasil e porque a sensação de insegurança não vai embora. Salvo quando não são demitidos e vão pro Canadá e Austrália trabalhar arrumando casa... opa, foi mal, ser Housekeeper.
   Esse dias completei 34 anos e acordei pro Matrix sem tomar a pílula azul de Rivotril. Na sequência resolvi pedir licença e desculpas pra sociedade, visto que ainda não achei meu lugar nessa estrutura e embaralhado social. E ainda digo que pode ser que eu demore pra ser menos amargo, me descontaminando de tanto comportamento mimado, sem causa e cheio de agressividade todas as vezes em que esbarro com um ego inflado chegando de Uber no bar. Solidão é triste, mas estar sozinho e se adentrar é algo precioso e ensina muito a enxergar melhor alguns processos. Vamos tentar fazer algo útil com um mundo de conhecimentos sujos de frustração movido a sonhos servidos com sangue frio de acompanhamento, temperados de FGTS pra beber com seguro desemprego. O mundo é maior do qualquer modelo de estrutura social que nos são oferecidas, logo acho justo que façamos disso uma porta aberta para um mundo de outras possibilidades fora de nossos quartos.
Fui tentar me encontrar e o triste é que "o bom filho, sempre à casa torna."