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14 de fevereiro de 2024

A Crônica de Carnaval de um Poeta Falido

  Meu sol se pôs no dia 21 de janeiro em meio aos dias em que as horas se arrastavam passando como se assim fossem minutos, tateando a rotina do vazio de tantas faltas, tanto porém e "deixa pra depois", porque eu tô cansando, porque não, porque sim. Não sabia direito quando ele viria, mas sabia que era hora de trocar o Depacote e as luzes de led em RGB por algo que envolvesse um pouco mais do sol que brotava dentre as persianas por volta da hora do almoço. 
  As pessoas que vivem em nossa cidade sabem dos melhores horários, a direção das tribos, aonde o sol nasce, aonde a água da praia é mais limpa, aonde comer bem, aonde ir pra respirar e recuperar o fôlego - Incrivelmente, nós nos acomodamos em nossos círculos e poucas vezes nos damos chances de ver as mesmas coisas de uma perspectiva diferente. 
  Até que em algum momento, as visitas chegam, admirando a nossa piscina construída no quintal da nossa casa, a piscina que um dia tanto sonhamos e batalhamos pra ter: trabalhamos muito, rodamos por alí e por lá, mas resolvemos nos estabelecer aqui. Vimos, sentimos, nos apaixonamos, escolhemos ficar pra viver na casa equipada e completona que nós apenas queríamos ter tempo pra curtir mais - sim, eu sei: o  Rio de Janeiro tem esse poder de ser uma incrível casa de privilégios que pouco nos esforçamos pra aproveitar de verdade, em alguns momentos.
  O ar condinicionado estava no máximo, limpo e gelando bem. A roupa de cama composta de lençóis egípcios e edredom suede de inverno cobria um colchão de casal em espuma maltratado pelos seus 3 anos de uso, no armário faltava uma porta que não resistiu a frustrações, enquanto luzes de led em rosa neon iluminavam o chão do quarto com a penumbra da tv. O dia tinha acabado de começar, eram 5:30h da manhã e me dei a chance de ir. Assim como quem tomava um remédio sem vontade. Um sábado de carnaval em Santa Teresa, sol, amigos e uma multidão aglomerada em prol do caos organizado pela harmonia de pessoas em sinergia. Suor, glitter, libido, álcool, fumaça em ritmo de quem se torna um andarilho da própria cidade. Fazendo as pazes com o quintal de casa, recebendo as visitas com sorriso.
  Bastou-me um dia que acabou no dia seguinte para que eu assim, procurasse a minha bolha, um lugar que me reconhecesse e aonde pudesse contar com a presença de um cinzeiro, em uma mesa confortável. Talvez eu quisesse um pouco de calma, pra poder realmente ver o pouco de paz que havia encontrado.
  O dj residente colocava Strokes pra gritar enquanto eu molhava a garganta seca de planta com água gaseificada, gelo e laranja. As pessoas começavam a chegar dos blocos de carnaval com as suas pernas cansadas, procurando talvez o mesmo que eu, que você e tantos outros. Enquanto um camarada de bar falava qualquer coisa sobre engenharia musical, um sotaque mineiro me pediu um isqueiro, assim: de forma tímida, como quem não quer nada, como alguém que chegou aonde queria sem saber direito como. Eram cores diferentes espalhadas pelo rosto e corpo melado de suor seco, em forma de glitter, compondo um quadro perfeitamente pintado em uma blusa rosa de alcinha, saia preta, sandália são francisco acomodando os pés, pernas torneadas em tom dourado de sol.
  Não me lembro direito se foram 20 ou 40 minutos de conversa, se foi um cigarro ou se foram dois. Sei que as histórias que ela contava eram engraçadas, ela falava sorrindo das suas viagens e aventuras. Foi quando em algum momento criei coragem de buscar o quê eu queria, mesmo encabulado, mesmo sem saber o quê falar. As línguas se encaixaram, os rostos se encostavam trocando suor enquanto as mãos, reconheciam cada pedaço de duas pessoas que pareciam brigar pra se engolir. 
  As figuras locais envolviam um médico federal, bem relacionado, pai. Ele cheirava toda a cocaína que conseguia e alí, equanto se apresentava oferecendo aquilo que não queríamos, tentando não enrolar a língua, uma garota doida de sei lá o quê fazia de tudo pra tentar beija-la e o "Xerequinha" oferecendo um chop, nos chamou pra pista de dança aonde ela se afastou das mãos do meu amigo tarado e enroscou nossas bocas em nossos pescoços, misturando baba, suor e todas as cores de glitter, se espalhando pelo nosso busto, enquanto ela arranjava um jeito de se encaixar na minha cintura, me fazendo sentir o seu sexo pulsando através da saia e da calcinha, nos jogando de um lado pro outro fezendo nascer os roxos que marcariam as nossas peles no dia seguinte.
  Sentamos pra descansar as varizes em uma mesa debaixo das palmeiras da Maria Quitéria e um pouco mais longe do som ouvi historias sobre a Europa, relacionamentos acabados, Ésse-pê e sua adolescência em Minas. Até que larguei seu pé direito que a essa altura, já estava quase com o dedão em esmalte vermelho na minha boca. Segurei sua mão, descemos a rua, nos engalfinhamos em um beco escuro, fomos andando pela orla e sentamos de frente pra areia esperando o sol começar a subir. Fiz massagens em seus pés, coxas, ombros, costas e seios. Tudo aquilo fazia minhas pernas tremerem, meus sentidos ficarem aguçados, rígidos e reagindo ao toque de forma pulsante. Foi quando deitei na areia, colocando suas coxas sobre meus ombros, deixando os pelos da minha barba melados por todo aquele suco de vontade que escorria pela virilha com cheiro de pele suada, enquanto o meio das suas pernas babava na minha boca, me deixando passear com a língua em movimentos de baixo pra cima, engolindo cada gota enquanto as suas mãos me puxavam pra dentro e suas pernas se abriam mais e mais, até seus dedos do pé se envergarem pra dentro, como quem tentava perdurar o ápice.
  Ela relaxou, respirava ofegante, me levantei, sentei ao seu lado e relaxada, ela me apalpava, desviando o seu olhar do meu, encarando o volume da minha bermuda, mordendo os lábios, me apertando com força. Já estava claro e as pessoas começavam a passar correndo ou com seus cachorros na beira do mar, saboreando o sol, vivendo o dia. E então disse a ela que estava tudo bem, que a noite pra mim já tinha sido perfeita. Ela filmou o sol nascendo, tirou uma foto nossa e antes de se levantar pra mergulhar, tirou a calcinha e me deu pra gaurdar. Entrou no mar calmo, flutuou sob ondulações calmas no mar verde cristalino de um dia quente de verão.
  Ao sair, seus lábios tremiam, sua pele estava arrepiada e ela se encolhia tentando manter a postura de quem não estava incomodada com nada, como se estivesse no primeiro date com alguém que julgasse de alguma forma, especial. Tirei minha camisa e lhe vesti, colocando seus dois ombros no meio do meu peito, assoprando a suas costas com meu hálito quente e esfregando a base da lombar até a nuca, na tentativa de esquentar-lhe.
 Seus pelos loiros da coxa já estavam secos, refletindo na luz dourada. Parei por alguns segundos que pareciam horas - eu sabia: meu cérebro tinha guardado cada detalhe daquela catarse.
  Nos abraçamos, levantando depois de um beijo longo e caminhamos pro calçadão. Depois pra rua, depois pro último beijo, depois pra sensação de que a paz emerge do caos. Passei-lhe a mão no rosto e me despedi daquele que foi um memorável dia de carnaval carioca.